Demon’s Crest é um poema trágico em pixels. Um dos jogos mais belos, sombrios e injustamente ignorados do Super Nintendo. Um verdadeiro clássico cult. Um mergulho profundo no legado demoníaco da Capcom nos anos 90, Demon’s Crest, um clássico obscuro.

📅 Lançamento: 21 de outubro de 1994 no SNES (América do Norte)
🏭 Desenvolvedora: Capcom
🎨 Direção de arte: Noritaka Funamizu
🎼 Compositor: Toshihiko Horiyama
🧱 Engine: Custom Capcom SNES engine
📚 Gênero: Ação/Plataforma com elementos de Metroidvania
🧍 Modo de jogo: Single-player
📺 Resolução: 256x224 (SNES nativo)
🕹️ Plataforma original: Super Nintendo Entertainment System (SNES)
🕹️ Outras plataformas: 2014 (Wii U), 2016 (New Nintendo 3DS) e 2019 (Nintendo Switch)
Pontos Fortes
✔️ Atmosfera única e gótica
✔️ Trilha sonora inesquecível
✔️ Mecânica de transformação criativa
✔️ Exploração no estilo Metroidvania
✔️ Múltiplos finais e alto fator replay
✔️ Direção artística impressionante para a época
Pontos Fracos
❌ Dificuldade elevada pode afastar jogadores casuais
❌ Progressão pode ser confusa sem um mapa claro
❌ Subestimado na época do lançamento — passou despercebido por muitos
Lista de Conteúdo
ToggleEntre as Chamas do Esquecimento
Lançado silenciosamente em 1994 para o Super Nintendo, Demon’s Crest é um daqueles jogos que desafiam o tempo — não por ter sido um sucesso comercial ou por ser parte de uma franquia massiva, mas por representar o ápice criativo de uma era que ousava experimentar com temas densos e atmosferas sombrias em um console geralmente associado à fantasia colorida e mascotes saltitantes.
Obra de uma Capcom corajosa e em plena forma técnica, o jogo é a terceira entrada da sub-série Gargoyle’s Quest, originada no Game Boy e depois no NES. Mas diferente de seus antecessores, Demon’s Crest leva sua narrativa, jogabilidade e estética a novos patamares, combinando o melhor da ação plataforma com elementos de exploração não linear — e uma camada inesperada de profundidade filosófica e melancolia.
Um Mundo em Ruínas: O Enredo de Demon’s Crest
A história começa de forma seca, direta e brutal: Firebrand, o protagonista demoníaco da saga, é arremessado ao chão, enfraquecido e preso, após ser derrotado por um dragão esquelético em um combate épico pelo controle dos Crests — artefatos de poder elemental supremo. Antes um guerreiro lendário, agora Firebrand está aprisionado, despojado de seu poder e prestes a ser executado.
Essa introdução, silenciosa e sombria, já revela que estamos diante de algo fora do convencional. A inversão de papéis — onde o herói é um demônio — transforma a narrativa em uma jornada de vingança, sim, mas também de reconstrução. Firebrand não luta para salvar o mundo ou proteger inocentes. Ele luta para recuperar seu lugar no topo da hierarquia infernal, para reaver aquilo que lhe foi tomado, e talvez, para encontrar algum sentido em sua existência devastada — mais uma camada sombria em Demon’s Crest – um clássico obscuro que desafia convenções desde seu primeiro minuto.
Durante o percurso, enfrentamos não apenas inimigos grotescos e chefes colossais, mas também a própria dúvida: Firebrand é um herói trágico ou uma força inevitável da destruição? Cabe ao jogador definir isso — e os múltiplos finais refletem essa ambiguidade com maestria.
A Jornada de um Anti-Herói: Jogabilidade e Exploração
Em termos de jogabilidade, Demon’s Crest é uma joia rara: ousa misturar gêneros com fluidez, oferecendo uma experiência híbrida entre plataforma, ação e Metroidvania — anos antes do termo ser popularizado.
Firebrand possui habilidades únicas desde o início: ele plana no ar após um salto, pode se agarrar a paredes e cuspir bolas de fogo. Mas o verdadeiro diferencial está nos Crests, cada um permitindo que o protagonista assuma uma nova forma com atributos específicos:
Aerial Gargoyle, por exemplo, dá a liberdade de voar em todas as direções, transformando completamente a abordagem dos cenários;
Tidal Gargoyle permite nadar com agilidade nas profundezas;
Ground Gargoyle aumenta o poder físico e destrói paredes antes inacessíveis;
A forma final, Legendary Gargoyle, combina todas as habilidades em uma versão suprema de Firebrand.
Essa mecânica transforma o level design em um verdadeiro quebra-cabeça tridimensional: fases antes superadas podem (e devem) ser revisitadas para descobrir novas áreas, segredos, e chefes opcionais. A progressão é orgânica, não há direções explícitas. O jogo confia na curiosidade do jogador, como um mestre de masmorra que esconde recompensas para aqueles que ousam explorar.
O mapa-múndi, ainda que pequeno, utiliza o Modo 7 do SNES com inteligência. A rotação da câmera e a sensação de liberdade entre as fases criam uma ambientação viva, mesmo sem NPCs ou cidades.
Pintando o Inferno em 16 bits: Gráficos e Direção de Arte
Visualmente, Demon’s Crest – um clássico obscuro do Super Nintendo, é uma aula de direção de arte gótica em 16 bits. Cada pixel parece cuidadosamente posicionado para evocar uma atmosfera de desolação, morte e misticismo. Catedrais em ruínas, cemitérios afogados por névoa, fortalezas flamejantes e florestas corrompidas compõem um bestiário visual que mistura arte gótica com horror barroco.
A direção de arte de Noritaka Funamizu é audaciosa. A paleta de cores foge do padrão saturado típico do SNES, preferindo tons escuros, azulados, rubros e verdes acinzentados. O uso criativo das camadas de parallax cria profundidade real nos cenários, com luzes dançantes e sombras em constante movimento — tudo isso sem sacrificar a performance do console.
O design dos inimigos é grotesco e fascinante. Eles não são apenas obstáculos: são entidades bizarras que parecem ter saído de pesadelos renascentistas. Dragões com costelas expostas, corvos deformados, quimeras flamejantes e demônios que choram sangue são apenas alguns exemplos.
Uma Sinfonia das Trevas: Trilha Sonora e Som
A trilha sonora de Demon’s Crest, composta por Toshihiko Horiyama, é uma obra de arte por si só. Abandonando a fórmula tradicional de melodias animadas, Horiyama constrói uma tapeçaria sonora feita de órgãos eclesiásticos, coros digitais e sintetizadores lúgubres. Cada fase possui uma identidade musical própria, que não apenas acompanha o tom visual, mas o expande.
Destaques musicais incluem:
O tema da catedral caída, que mistura notas dissonantes com ecos sinistros;
A música de Phalanx, que soa como um réquiem para um império em colapso;
E a sobreposição de silêncio e tensão em fases de exploração profunda, onde a ausência de música se torna uma presença em si.
Os efeitos sonoros também merecem menção: os gritos dos inimigos, os estalos da magia, o rugido dos chefes, e até o som abafado dos passos em solo encharcado criam uma sensação de presença palpável.
Um Inferno de Desafios: Chefes e IA
Os chefes de Demon’s Crest são um show à parte. Eles não apenas são artisticamente memoráveis, mas também apresentam padrões de ataque inteligentes, que evoluem conforme o jogador aprende a enfrentá-los. Alguns exigem pura habilidade de plataforma, outros, domínio das formas demoníacas.
Arma, um dos rivais recorrentes, aparece diversas vezes com formas novas e força crescente, funcionando quase como um reflexo sombrio de Firebrand. Já Phalanx, o antagonista final, tem múltiplas fases e destinos, dependendo do caminho que o jogador escolheu até ali.
Os Finais: Escolhas, Ambiguidade e Destino
Uma das maiores surpresas para jogadores da época foi a existência de múltiplos finais — mais uma prova de que Demon’s Crest – um clássico obscuro esconde profundidades inesperadas. O jogo possui três principais desfechos e um final verdadeiro — desbloqueado apenas se o jogador coletar todos os Crests e enfrentar uma última e devastadora forma de Phalanx, chamada de "Ultimate Phalanx".
Esses finais não apenas servem como recompensa, mas como forma de refletir as escolhas feitas ao longo da jornada. Firebrand pode assumir o trono como rei absoluto dos demônios… ou ser consumido pela ambição que buscava dominar.
Recepção e Legado
No lançamento, Demon’s Crest não vendeu bem. Lançado tardiamente e sem grande marketing, acabou ofuscado por títulos mais chamativos da época. Porém, com o passar dos anos, passou a ser redescoberto por colecionadores, fãs de horror gótico e analistas de game design. Hoje é cultuado como um dos melhores jogos do SNES.
Cópias físicas completas chegam a valores altos em sites de leilão, e o jogo foi reintroduzido em plataformas como o Virtual Console e o Nintendo Switch Online.
Detalhes Técnicos e Curiosidades
O jogo roda a 60 FPS estáveis, mesmo com efeitos complexos e animações fluídas.
Seu cartucho de 16 Megabits (2 MB) mostra como a Capcom dominava a compressão e otimização de dados no SNES.
Não há uso de chips especiais, como o Super FX, o que torna os efeitos visuais ainda mais impressionantes.
Há um cheat escondido que ativa invencibilidade na versão japonesa.
Firebrand é um dos poucos personagens da Capcom a protagonizar um jogo inteiro como vilão.
Demon’s Crest inspirou jogos modernos como Blasphemous, Death’s Gambit e até Dark Souls, com sua abordagem de mundo decadente, narrativa fragmentada e simbolismo sombrio.
Firebrand voltou à vida em jogos como Marvel vs. Capcom 3, onde mantém muitas de suas habilidades clássicas.
Conclusão: O Inferno Merece um Trono
Demon’s Crest – um clássico obscuro é mais do que um jogo esquecido. É uma experiência artística completa - um épico sombrio em 16 bits, que desafia convenções e entrega profundidade emocional, estética e mecânica como poucos de sua geração.
Seu protagonista demoníaco, suas ruínas sufocantes e sua trilha fúnebre ecoam na memória de quem ousou explorá-lo. Firebrand pode ser um demônio, mas em sua jornada encontramos algo profundamente humano: o desejo de se redimir, se reconstruir e, acima de tudo, deixar uma marca no mundo — mesmo que seja em chamas.